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Guilherme Macalossi

Guilherme Macalossi

Religião

O papa não é um garoto-propaganda de sua ideologia

papa francisco recebe alta do hospital
O papa Francisco saúda os fiéis de uma sacada do hospital Gemelli, em Roma. (Foto: Ettore Ferrari/EFE/EPA)

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O papa Francisco era um homem bom. Tão bom quanto um homem pode ser. E isso já é muito mais do que a média. Se todos os demais que habitam esse vale de lágrimas se portassem como ele, na certa os desafios da humanidade seriam menores e estaríamos mais próximos de Deus. Perdemos, portanto, uma das mais importantes figuras do mundo. Alguém que inspirava admiração, sabedoria, humildade, dentre outros valores que ajudam a definir e moldar não apenas bons cristãos, mas indivíduos que amam o próximo. Que na hora de sua morte se alevantem os detratores com o dedo em riste para questionar seu papel junto a Igreja, diz nada sobre o Papa e tudo sobre eles.

A cobertura de parte considerável da imprensa sobre o pontificado de Francisco e os caminhos do Catolicismo, diga-se, não vai além de um reducionismo lamentável que equipara os temas religiosos aos da política mundana. Mesmo admitindo que tais temas possam eventualmente colidir ou sejam contraditados (a velha dicotomia entre a lei dos homens e a lei de Deus), fato é que a forma e o campo de suas respectivas abordagens não poderiam ser mais distintos.

Tomar o pontífice, seja ele Francisco ou Bento, como um agente promotor de uma determinada corrente ideológica é secularizar ao nível mais tacanho do partidarismo a conduta de alguém que tem como missão perpetuar a mensagem do próprio Cristo

A repercussão jornalística passa ao largo da transcendência, do eterno, se apegando apenas a uma tentativa desesperada de levar para dentro da Igreja a lógica da polarização partidária, separando padres e cardeis por greis ideológicas. Como se houvesse um grupo supostamente conservador em oposição a um grupo supostamente progressista. E que nisto estaria o fundamento de toda a discussão que se daria durante o conclave. Um conclave reduzido de significado, como se ali estivessem apenas uns congressistas de batina. A Capela Sistina como palco de uma convenção simultânea do PL e do PT.

Decorrente de tal erro de abordagem, diga-se, o jornalismo acaba é por insuflar a polarização que diz combater. Cria espantalhos ideológicos a serem temidos. O tom adotado pela maioria das editorias é de crítica aos cardeais identificados com a doutrina tradicional, como se estes fossem uma ameaça para a humanidade.

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O apreço de certo jornalismo para com o papa Francisco, aliás, também se dá nos termos da política partidária, assim como a rejeição que tinham por Bento XVI, por simbolizar o exato oposto do que estes entendiam como adequado. E o mesmo se pode dizer dos sedizentes tradicionalistas que identificam nos papas que desabonam como falsos ocupantes do Trono de Pedro. Um lado se abraça insanamente no outro.

Tomar o papa, seja ele Francisco ou Bento, como um agente promotor de uma determinada corrente ideológica é secularizar ao nível mais tacanho do partidarismo a conduta de alguém que tem como missão perpetuar a mensagem do próprio Cristo. Quem o faz, torna o papa não um servo de Deus, mas um garoto-propaganda de sua particular visão de mundo. A fé como subproduto distorcido pelo fanatismo não tem nada a ver com Deus, é apenas tributo ao ódio que carcome a humanidade.

Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

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