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Normalmente, eu não tenho feito comentários e reflexões sobre temas atuais e políticos envolvendo a educação. Reflito filosoficamente apenas sobre assuntos que acredito ser de muita importância nesta área. Entretanto, o que irei falar agora é algo atualíssimo, fato que ocorreu nesta última semana, que é o decreto de extinção do Departamento de Educação dos Estados Unidos.
Iniciaria dizendo que esta reflexão não tem relação com a minha passagem meteórica pelo nosso Ministério da Educação brasileiro. Não pude aquilatar os benefícios que ele desempenhou para o desenvolvimento do Brasil, apenas verifiquei rapidamente é o como se realiza dispêndios milionários em prol de um ideal educacional sem a menor condição de se conhecer o real sucesso no empenho do recurso dispendido.
Ou seja, gasta-se muito, sem critério e sem objetivo, tudo em prol da educação brasileira, mesmo sem que se tenha a noção do que seja educação, pois apenas falam de ensino, e mesmo neste aspecto pouco se sabe. Verifiquei o comércio financeiro que existe ali, onde várias instituições de todas as áreas que se conheça buscam se aproximar de temas relativos à educação tão somente para se beneficiarem de transferências financeiras para atividades não muito relacionadas ao fim do Ministério.
O presidente Trump está realizando na prática, a intenção de outro presidente americano que foi Ronald Regan, no início da década de 1980, a qual era extinguir o Departamento de Educação criado por Jimmy Carter em 1979 por um motivo simples: ineficiência e falta de tradição. Ocorreu um problema na época, muito bem descrito pelo então Secretário da pasta Terrel H. Bell, o qual escreveu em seu livro “The Thirteenth Man” (1988), que impediu politicamente o presidente de abolir o Departamento de Educação naquela época.
Nos Estados Unidos, o Departamento de Educação foi criado em 1979 e implementado no ano seguinte, está sendo extinto agora em 2025, carecendo ainda de aprovação no Congresso Americano. Foram 45 anos de falta de eficiência e gasto de dinheiro público
Foi a publicação de uma pesquisa chamada “A Nation at Risk: The Imperative for Educational Reform”, que mostrava que a educação americana estava em sério risco e precisava ser reformada. Tal pesquisa foi manipulada pelos seus elaboradores e pela mídia em geral que passou a exigir reformas que como já mostramos ao longo de nossos artigos anteriores mostraram-se ineficientes e ineficazes. O interesse da época, hoje muito bem sabido, era a centralização educacional e com isto o controle do que se ensinava nas escolas, fugindo da tradição americana e mundial da educação descentralizada, a qual demostra ser muito mais eficiente, obedecendo a natureza humana da individualidade intelectiva que nos torna pessoas e que se faz ao longo das nossas vidas.
O sistema educacional americano apresenta, como disse o atual presidente, o maior valor financeiro por aluno do mundo, e como eu disse em meu livro sobre o Problema da Educação Brasileira (2023), esses recursos não são revertidos para a melhoria, nem da educação, nem do ensino daquele país. Fato verificado também aqui no Brasil.
O grande problema daquela pesquisa americana foi que o entendimento sobre o que é educação estava sendo desvirtuado. A consideração sobre o que se deveria aprender na escola foi alterada, levando a toda a sociedade americana acreditar que seus filhos deveriam sair da escola com uma profissão e enfrentar o mundo industrializado que se formava dentro de um projeto inicial de globalização econômica mundial. A economia estava assumindo as rédeas das escolas e o sistema econômico exigia reformas, afastando o conhecimento e favorecendo o ensino de habilidades que fossem úteis à sociedade.
Este processo teve início muito tempo antes, por exemplo podemos ver no relatório de 1828, realizado na Universidade de Yale, publicado pelo CEDET em 2016, no qual o currículo clássico estava sendo questionado e o conselho da corporação da Faculdade de Yale se negou a alterar, mantendo os conhecimentos clássicos na sua ementa e enfatizando que se ocorressem as mudanças da modernidade “o valor de uma educação acadêmica cessaria e o nível geral de valor intelectual e moral cairia e a liberdade civil e religiosa seria colocada em risco por causa da desqualificação dos cidadãos”. O relatório enfatiza também que a democracia estaria sob ameaça, bem como o exercício do direito.
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Embora Yale não quisesse mudar, mantendo seu elevado padrão acadêmico, isto não se manteve e, já no início de 1900, os verdadeiros educadores dos Estados Unidos perderam a guerra contra os economistas e seu sistema educacional que era totalmente descentralizado, tendo cada um dos Estados a autonomia total, foi sendo transformado para um sistema de ensino centralizado em um departamento e não mais um sistema de educação descentralizado.
Quem diz isto foi um educador americano chamado Franklin Bobbitt em 1918, no seu livro The Curriculum, no qual escreve já em suas primeiras páginas que estava ocorrendo uma disputa sobre o pensamento educacional nas escolas em seu país, onde havia aqueles que defendiam que a educação deveria primariamente enriquecer a mente, acelerar as apreciações, refinar as sensibilidades, a disciplina e a cultura.
Mas havia outra corrente a qual exigia que a educação fosse primaria e conscientemente voltada para a ação prática eficiente dentro de um mundo prático, fazendo com que os alunos fossem levados a ter uma eficiente performance nos trabalhos para os quais fossem vocacionados. Como já disse, os filósofos educacionais da economia venceram a disputa, claro que com muito dinheiro investido em propaganda. Entretanto, não basta a propaganda, se faz necessário o resultado.
E, nesse quesito, vimos os planos centralizados de George W. Bush com o encontro de educação com os governadores em Charlottesville e suas metas nacionais de educação em 1989, o chamado America2000. Vimos o presidente Bill Clinton reviver o America 2000 em 1993 e George W.H. Bush criar o No Child Left Behind em 2002, com seus testes e padrões sendo realizados para verificar o que se estava ensinando nas escolas, incluindo punições para professores, diretores e escolas. Criaram currículos básicos em 2007, acreditando na padronização das crianças.
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Em 2009, Barak Obama também teve seu plano “Racetothe Top” incluindo o “Commom Core”, tudo coordenado por organismos particulares sob controle de seus proprietários sem passar por qualquer ingerência legislativa, sendo, portanto, imposto como objetivo e com os fins financeiros de fundações americanas de interesses escusos. Os resultados não apareceram, os Estados Unidos não são exemplo de nação na área educacional.
Agora, verificando esta ação conduzida pelo presidente americano, podemos identificar uma tentativa salutar em retomar os destinos educacionais dos Estados Unidos e devolvê-los os seus legítimos e tradicionais donos que são os Estados Federados. A existência e as ações do Departamento de Educação são, em si, inconstitucionais nos Estados Unidos. Sua Constituição não permite que haja interferência nesta área nos Estados, dessa maneira, fica restabelecida a ordem constitucional naquele país.
Isso tudo teve reflexo por aqui em terras brasileiras. Em 2016, observamos um documento do Lemann Center, na Universidade de Stanford, que é um trabalho sobre as dificuldades de se implantar os padrões básicos no sistema americano para se realizar aqui no Brasil tal tarefa. A nossa chamada BNCC (Base Nacional Comum Curricular) é fruto deste movimento de centralização e que no Brasil iniciou em 1930, com a criação do Ministério da Educação, por Getúlio Vargas, que, é claro, foi um ditador, e como tal desejava a centralização de todas as áreas, aí incluída a educação.
Nos Estados Unidos, o Departamento de Educação foi criado em 1979 e implementado no ano seguinte, está sendo extinto agora em 2025, carecendo ainda de aprovação no Congresso Americano. Foram 45 anos de falta de eficiência e gasto de dinheiro público nesse Departamento de Educação. Aqui, nosso Ministério de mesmo nome já possui 95 anos e nada para comemorar. Creio ser a falta de um prêmio Nobel brasileiro um dos resultados dessa política centralizadora que nivela por baixo nossos discentes.
Seria muito pensar na sua desativação também? Devolver aos nossos estados o dinheiro que é centralizado no ministério e devolvido sob condições? Não seria bom deixar o dinheiro com seus donos e deixar a responsabilidade educacional com quem deve tê-la?
A centralização de muitas atividades nem sempre trazem eficácia. Acredito que uma professora no nordeste sabe o que ensinar ao seu estudante, bem como um professor do centro oeste ou do sul do país. Não é necessário um burocrata em Brasília definindo atividades pedagógicas a serem ordenadas para todo este país continental. Será que estou errado?
Outra coisa que chama a atenção diz respeitoà nomenclatura do Ministério da Educação. Educação, assim compreendo,abrange um conjunto de interesses tais como o ensino, a saúde, o trabalho, a justiça, o esporte, a economia, a segurança, enfim, todas as atividades humanas estão relacionadas na educação, além do que esta se realiza ao longo de toda a vida humana, não apenas nos primeiros anos da juventude. Dessa maneira, a educação deve estar presente em todos os ministérios de um governo, fato que não acontece. O atual Ministério da Educação trata apenas de ensino e não destas atividades todas que enumerei. Assim, no meu ponto de vista, o nome apropriado para esse ministério, caso ele se mantenha, fato que acredito ser totalmente desnecessário, deveria ser Ministério do Ensino, bem como as Secretarias Estaduais e Municipais, deveriam também mudar seus nomes para Secretarias de Ensino.
Claudio Titericz, coronel reformado do Exército; é bacharel, mestre e doutor em Ciências Militares e bacharel em Teologia; estudante permanente de Filosofia da Educação e ex-integrante do Ministério da Educação e é um dos fundadores do Instituto de Biopolítica Zenith, autor do livro “O Problema da Educação Brasileira”.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos