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A absolvição do ex-jogador brasileiro Daniel Alves de acusações envolvendo agressão sexual de uma jovem na Espanha ganhou espaço na política, nos últimos dias, principalmente por parte da esquerda.
O Partido Socialista (PSOE) da Espanha afirmou nesta segunda-feira (31) ser "muito difícil de digerir" a absolvição do ex-jogador brasileiro das acusações.
A legenda se juntou ao posicionamento da primeira vice-presidente do Executivo e ministra da Fazenda, María Jesús Montero, que no sábado (29) chamou a decisão de uma "vergonha".
Em declarações à imprensa, a secretária de Igualdade do PSOE, Pilar Bernabé, comentou nesta segunda-feira que "é uma sentença muito difícil de engolir. Temos de respeitá-la, mas é muito difícil de engolir".
Ela afirmou que a decisão do Tribunal Superior de Justiça da região da Catalunha (TSJC) de anular a pena de quatro anos de prisão pelo estupro de uma jovem "não ajuda" outras mulheres a denunciarem.
Sobre a decisão
Na última sexta-feira (28), o tribunal acatou por unanimidade o recurso interposto pela defesa do jogador e o absolveu da acusação de agressão sexual, concluindo que a decisão do Tribunal de Barcelona que o condenou estava repleta de "lacunas, imprecisões, inconsistências e contradições".
Em um evento partidário há dois dias, a socialista María Jesús Montero criticou "o fato de que o depoimento de uma vítima ainda está sendo questionado e que a presunção de inocência é frequentemente considerada mais importante do que o depoimento de mulheres jovens e corajosas que decidem denunciar os poderosos, os grandes, os famosos".
Segundo Bernabé, apenas 8% das vítimas de agressão sexual denunciam o crime e, portanto, essa decisão não faz nada para "incentivar algo básico e fundamental" — ou seja, registrar queixas.
A coordenadora do Catalunha em Comum, Candela López, expressou sua "indignação e perplexidade" pela absolvição de Daniel Alves e manifestou preocupação com o "impacto social" que esta sentença pode ter.
Em entrevista coletiva, Candela explicou que membros da coligação participarão do protesto que acontecerá esta tarde sob o lema "Vergonha e Impunidade".
Para López, a sentença, que absolveu o brasileiro representa um "retrocesso" porque pinta um "estereótipo de como deve ser uma 'boa' vítima de agressão sexual". Ela ressaltou que a denunciante sempre manteve a mesma versão, enquanto Daniel Alves a alterou até cinco vezes.
Também afirmou que interpretações dos fatos como as desta decisão "aumentam a incerteza jurídica".
Presunção de inocência é um direito fundamental, apontam juízes
Pelo contrário, as associações de juízes e procuradores pediram neste dia que seja "essencial" que instituições e representantes públicos respeitem e apoiem o trabalho dos juízes, "evitando comentários que possam minar a confiança no nosso sistema judicial".
Em um comunicado conjunto, sete associações espanholas de juízes e promotores responderam às declarações da política socialista.
Destacaram que as decisões judiciais são tomadas após análise criteriosa das provas apresentadas e de acordo com a legislação vigente.
Advertiram que a presunção de inocência é um direito fundamental da Constituição espanhola e garante que nenhuma pessoa é considerada culpada até que sua responsabilidade criminal seja comprovada com provas suficientes obtidas de acordo com a lei.
"Questionar esse princípio básico pode colocar em risco salvaguardas processuais e julgamentos justos", afirmaram.
Em relação à proteção das vítimas, as associações afirmaram que é fundamental que elas se sintam apoiadas e que seus depoimentos sejam valorizados com a seriedade e a sensibilidade que merecem. Essa proteção deve coexistir com o respeito aos direitos fundamentais dos acusados, assegurando um equilíbrio que garanta a Justiça em cada caso específico.
Por sua vez, a Associação de Mulheres Juízas (AMJE) apelou à plena aplicação da jurisprudência que valida as declarações das vítimas como prova contra elas.
Eles lembram que, durante muitos anos, a jurisprudência do Supremo reconheceu que a declaração da vítima pode ser suficiente para justificar uma condenação, mesmo que seja a única prova disponível.