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Apesar de não ser uma unanimidade dentro do próprio partido, o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, lançou a pré-candidatura presidencial para as eleições de 2026 pelo União Brasil, no início do mês. A lista dos presentes e a ausência de lideranças do partido no evento em Salvador (BA) evidenciam a cisão interna no União Brasil em relação à corrida pelo Palácio do Planalto. De um lado, a sigla possui opositores históricos ao petismo, no entanto, a legenda integra o governo Lula no comando de três ministérios.
A capital baiana, a maior administrada pelo União Brasil, foi escolhida como sede do evento de lançamento da pré-candidatura de Caiado pelo apoio do prefeito Bruno Reis e, principalmente, pelo aval do cacique do partido ACM Neto, vice-presidente nacional da sigla. O time pró-Caiado ainda tem o apoio do senador Sergio Moro (União-PR), ex-juiz da operação Lava Jato e desafeto de Lula.
Por outro lado, o presidente nacional da sigla, Antônio Rueda, e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), não estiveram prestigiaram o evento em Salvador, marcado pelo desabafo de Caiado. “O partido está aberto a todos que quiserem disputar a prévia. O partido não tem a decisão de dizer quem pode e quem não pode. Quem tiver coragem, independência moral e intelectual se apresente”, disse o governador na ocasião.
Caiado ainda declarou que não cabe ao presidente do União Brasil “tomar parte de candidato” no momento ou que os pré-candidatos devem ficar “na sombra de 'a 'ou de 'b'”. “Candidato tem que se apresentar, ir pras prévias, isso é que o União Brasil está fazendo”, defendeu Caiado.
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Federação com PP pode consolidar projeto presidenciável de Caiado
Com 100% do apoio do União ainda longe da realidade, Caiado conta com o engajamento de políticos de outras siglas que se manifestaram em favor da pré-candidatura presidencial própria. E a principal aposta de Caiado é o anúncio da federação negociada entre União Brasil e PP, que pode sacramentar o nome do governador como pré-candidato da nova federação partidária. Do lado do Progressistas, a senadora Tereza Cristina - ex-ministra do governo Jair Bolsonaro (PL) - aparece entre as opções de presidenciáveis.
Na semana passada, Caiado participou do lançamento de livro do presidente nacional do Republicanos, deputado federal Marcos Pereira, afirmou que o evento se tratava de um “gesto suprapartidário” e rasgou elogios ao parlamentar pela trajetória como jurista e também pela carreira política. “Ele preside um dos partidos mais importantes do país. Sem dúvida, conseguiu construir a sua trajetória no meio político e o Republicanos é um partido de repercussão nacional com posicionamentos claros dentro da Câmara”, afirmou Caiado, que esteve ao lado de Rueda na festa.
Nos bastidores do evento, a federação com o PP teria sido confirmada com anuência do líder nacional do Progressistas, Ciro Nogueira. Por sua vez, no estado do Rio de Janeiro, o governador de Goiás conta com o apoio do primo Carlo Caiado (PSD), aliado do prefeito Eduardo Paes (PSD), antigo parceiro político de Lula que teve forte apoio petista para reeleição carioca em 2024.
Além do primo, o governador goiano recebeu o apoio do deputado federal Otoni de Paula (MDB). O parlamentar do Rio de Janeiro é pastor da Assembleia de Deus e tem influência política sob o eleitorado evangélico. Em discurso no plenário da Câmara dos Deputados, Otoni chamou o governador goiano de “direita raiz” por defender, historicamente, as pautas conservadoras antes mesmo do uso do slogan político “Deus, pátria e família”.
“O lançamento da pré-candidatura de Ronaldo Caiado não é a celebração da divisão da direita, mas uma alternativa a ser apresentada em face ao impedimento do presidente Jair Bolsonaro, que hoje se encontra inelegível. Caiado sempre foi um político de direita e nunca negociou esses valores com Lula ou com o PT”, pontuou o emedebista, que eivdenciou a aprovação popular do governo goiano, principalmente na área da segurança pública.
Em manifestação pública, o União Brasil afirmou que "permanece coeso na construção de um projeto sólido" para o país e que mantém o respeito "às posições individuais de seus líderes e o compromisso com decisões estratégicas que fortaleçam a legenda". Sem citar Caiado, o partido declarou que Rueda é a "favor do diálogo democrático e reafirma o propósito de estimular o debate sobre o futuro do Brasil."
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Entre governo e oposição, pragmatismo do União Brasil tem pouca influência sobre Caiado
Em entrevista à Gazeta do Povo, a consultora política Andreia Maidana analisa que o lançamento da pré-candidatura de Caiado direciona, antecipadamente, os holofotes para o governador de Goiás, que sai na frente na articulação política pelo projeto nacional em relação aos outros governadores considerados presidenciáveis. Na direita, Caiado disputa o papel de alternativa a Bolsonaro com outros três governadores: o paulista Tarcísio de Freitas (Republicanos), o mineiro Romeu Zema (Novo) e o paranaense Ratinho Junior (PSD).
Na avaliação de Maidana, a antecipação é estratégica, pois movimenta o xadrez político na disputa dentro do espectro da direita, apesar de não garantir sequer a candidatura oficial para o pleito presidencial do próximo ano. “Enquanto a situação do principal pré-candidato, Jair Bolsonaro, não se define, o governador se apresenta como o nome do União Brasil e vamos ver se o Caiado consegue conquistar o apoio consensual do próprio partido, o qual ele ainda não tem”, comentou a cientista política.
Maidana ressaltou que o pragmatismo político do União Brasil - com parlamentares opositores ao governo federal e outros que ocupam cargos na gestão Lula - deve ter pouca influência sobre a consolidação da candidatura de Caiado dentro do partido. Ela analisa que o União Brasil conta com três ministérios e, no entanto, é o quarto partido que menos votou com o governo na Câmara. "O ponto crucial é criar e manter uma envergadura para manter-se como candidato relevante na corrida presidencial”, diz.
Com alta aprovação em Goiás - com destaque para as áreas de segurança pública e educação - neste segundo mandato como governador, a cientista política afirma que a pré-candidatura de Caiado deve atrair outras legendas para discussão de possíveis alianças políticas. “É natural que conte com apoio de outras siglas, as quais enxergam nele uma figura que corresponde às agendas políticas dos partidos, mesmo não havendo consenso em sua própria legenda, o União Brasil”, completou.
“O ponto crucial é criar e manter uma envergadura para manter-se como candidato relevante na corrida presidencial”
Cientista política Andreia Maidana
Recusa de ministério tem potencial de estremecer relação entre União e governo Lula
A frente de três pastas no governo Lula - os ministérios das Comunicações, Integração e Desenvolvimento Regional e Turismo - o União Brasil passa por um momento de instabilidade dentro da gestão presidencial petista. A relação do partido com o governo Lula ficou estremecida após a saída de Juscelino Filho (União-MA), afastado do comando do Ministério das Comunicações depois de ser denunciado pela Procuradoria Geral da República (PGR) por suspeita de desvio de verbas de emendas parlamentares.
Indicado para a vaga pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, o deputado federal Pedro Lucas (União-MA) recusou o convite do governo Lula, escancarando a frágil governabilidade do petista e a dependência do Centrão. “Sou líder de bancada diversa. Posso contribuir mais com o governo na função que exerço na Câmara”, disse na última terça-feira (22).
O impasse foi resolvido na quinta-feira (24) com a confirmação do nome do presidente da Telebras, o engenheiro civil Frederico de Siqueira Filho, como novo ministro das Comunicações, também indicado por Alcolumbre. Nos bastidores, a negativa ao convite foi vista como um vexame de Lula e pode indicar o afastamento do União Brasil do governo federal no ano pré-eleitoral, que teve os primeiros meses de 2025 marcado pela queda de popularidade do presidente.
No entanto, integrantes do partido ainda defendem a coalizão e apoio à reeleição de Lula em 2026. Durante entrevista ao programa Roda Viva, na TV Cultura, no início deste mês de abril, o ministro do Turismo, Celso Sabino (União-PA), declarou que respeita a posição e o sentimento do governador Caiado, que deve defender a pré-candidatura nas prévias do partido. Porém, Sabino manifestou abertamente o apoio à reeleição de Lula.
“A gente tem uma ampla maioria formada por deputados na Câmara, por senadores no Senado, por lideranças em todo o país e tenho certeza que, em 2026, o nosso partido terá uma maioria ainda maior na defesa da reeleição do presidente Lula”, afirmou.
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