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Entre os sete estados das regiões Sul e Sudeste, apenas Minas Gerais registrou aumento no índice de homicídios dolosos, aqueles com intenção de matar. Em 2024, o estado mineiro teve uma alta de 4,6% nas mortes violentas, na comparação com o ano anterior.
A reportagem da Gazeta do Povo consultou os dados fornecidos pelas secretarias da Segurança Pública dos estados. Entre as regiões Sul e Sudeste, o Paraná é o único estado que ainda não divulgou os números completos de 2024.
O Rio Grande do Sul foi o estado com a maior redução percentual de homicídios, registrando queda de 17% em relação a 2023. A queda nos homicídios dolosos nos estados das regiões analisadas segue da seguinte forma:
- Rio Grande do Sul: -17% no índice de homicídios de 2024, na comparação com 2023
- Espírito Santo: -12,8%
- Rio de Janeiro: -11%
- São Paulo: -3,4%
- Santa Catarina: -1,8%
Os estados de Sul e Sudeste são, em sua maioria, governados por gestores alinhados à direita e centro-direita e somam mais de 114 milhões de habitantes, o que representa 56,5% da população brasileira. Em uma articulação iniciada em 2019 e que ganhou musculatura nos últimos anos, os governadores das regiões estruturaram o Consórcio de Integração Sul e Sudeste (Cosud) para fortalecer a cooperação entre os governos estaduais e ter uma voz única em reivindicações regionalizadas - e a área da segurança é uma das prioritárias nessa iniciativa.
São Paulo aposta em "asfixiar financeiramente o crime"
Sob a gestão do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e do secretário da Segurança Pública Guilherme Derrite, São Paulo atingiu os menores índices de homicídios desde 2001. O resultado também foi observado nos crimes de roubo.
A gestão estadual na área da segurança é considerada "linha dura" e tem focado na repressão ao crime, especialmente a facções. Os homicídios dolosos caíram de um total de 2.605 casos em 2023 para 2.517 no último ano. Já os roubos tiveram queda de 15,1%, de 228.028 para 193.658 registros.
Desde o início da série histórica, o estado reduziu significativamente a taxa de homicídios. Em 2001, eram 35 mortes por 100 mil habitantes, o maior índice já registrado. Em 2024, o número caiu para 5,9 por 100 mil habitantes, a menor taxa da série.
Em entrevista à Gazeta do Povo, o secretário da Segurança Pública de São Paulo atribuiu a queda à ampliação do efetivo policial e ao investimento em tecnologia. “Intensificamos o uso da tecnologia no combate ao crime, especialmente aqueles contra a vida. Também enfrentamos o déficit de policiais, reforçando os quadros com novos concursos. Os índices mostram que estamos no caminho certo e seguiremos asfixiando financeiramente o crime”, afirmou Derrite.
66% das vítimas de homicídios em SC tinham antecedentes, diz governo estadual
Santa Catarina registrou a menor redução percentual de homicídios entre os estados do Sul e do Sudeste, mas ainda sim uma queda: -1,8% nas mortes violentas, passando de 571 registros em 2023 para 561 no ano passado.
A Segurança Pública catarinense destacou que 66% das vítimas fatais tinham antecedentes criminais. “Em 2024, Santa Catarina manteve seu padrão de segurança, com reduções expressivas nos principais índices de criminalidade. Esses números refletem o comprometimento das forças de segurança, a eficiência das estratégias integradas e os investimentos do governador Jorginho Mello. Somos referência nacional em segurança pública”, afirmou o secretário estadual, coronel Flávio Graff.
Por outro lado, os latrocínios - roubos seguidos de morte - aumentaram 45% no estado, subindo de 11 para 16 casos. O comandante-geral da Polícia Militar, coronel Aurélio José da Rosa, destacou o investimento na área.
“A PM tem recebido investimentos para ampliar o efetivo e modernizar equipamentos, garantindo a qualidade do serviço essencial de manutenção da ordem pública e proteção da vida do catarinense”, afirmou.
Governador do Rio de Janeiro critica necessidade de "retrabalho" da polícia
Com um "carimbo" histgórico de violência e disputas entre facções criminosas, o estado Rio de Janeiro encerrou 2024 com o menor número de homicídios dolosos desde o início da série histórica, em 1991. A redução foi de 11%, com os registros caindo de 3.388 para 2.930.
Além de representar a maior queda dos últimos anos, pela primeira vez em mais de três décadas o estado registrou menos de 3 mil homicídios anuais. Outro dado positivo destacado pelo governador Cláudio Castro (PL) foi a apreensão de fuzis, que cresceu 20% em relação a 2023, totalizando 732 armas retiradas de circulação.
Em entrevista coletiva, Castro elogiou o trabalho da Polícia Militar, mas criticou a atuação do Poder Judiciário. “Os dados do ISP [Instituto da Segurança Pública, órgão do governo estadual] mostram que nossos policiais estão nas ruas todos os dias apreendendo armas, drogas e prendendo criminosos. No entanto, muitos desses criminosos já foram presos várias vezes, o que gera um retrabalho policial constante. Precisamos atualizar a legislação, torná-la mais rígida, para que o crime deixe de ser um atrativo”, afirmou o governador fluminense.
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Queda de homicídios e outros crimes no RS pode impulsionar candidatura de Leite
O Rio Grande do Sul encerrou 2024 com uma redução de 17% nos homicídios. Foram registrados 1.380 casos no ano, contra 1.669 em 2023. Outros crimes violentos, como latrocínios e feminicídios, também apresentaram queda.
Os números obtidos na área da segurança foram anunciados pelo governador Eduardo Leite (PSDB). “Pelo segundo ano consecutivo, temos o ano mais seguro da série histórica, com 2024 quebrando o recorde de 2023. Tivemos redução em todos os indicadores: homicídios, latrocínios, feminicídios e crimes contra o patrimônio. Sabemos que ainda há desafios, mas é incontestável que estamos no melhor caminho”, afirmou Leite.
Entre os governadores de Sul e Sudeste, Leite é um dos mais distantes da direita e do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Considerado um presidenciável entre os tucanos, Leite tem utilizado a redução dos índices criminais para tentar se aproximar do eleitorado mais conservador nas redes sociais.
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Espírito Santo registra menos de 900 homicídios pela primeira vez
Se o Paraná não divulgou os índices criminais referentes ao ano de 2024 fechado até meados de fevereiro, o estado do Espírito Santo prestou essa informação publicamente logo no primeiro dia de 2025. No ano passado, o estado registrou 852 homicídios, uma queda significativa de 12,8% em relação aos 976 casos de 2023. Foi a primeira vez desde o início da série histórica, em 1996, que o número ficou abaixo de 900 registros.
Com esse resultado, a taxa de homicídios do estado caiu para 20,8 por 100 mil habitantes, um feito inédito do estado na série histórica. É um índice abaixo da média nacional de 24 assassinatos por 100 mil habitantes, verificado em 2023.
Único governador de esquerda de Sul e Sudeste, Renato Casagrande (PSB), aliado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), celebrou os números da segurança pública. “Já tivemos diferentes secretários nesses três mandatos, mas os números seguem melhorando, porque esse é um programa de governo. Pela primeira vez na história encerramos o ano com menos de 900 homicídios. Em 2011, quando assumi pela primeira vez, tínhamos mais de 2 mil homicídios anuais e uma taxa de 52 mortes por 100 mil habitantes. Agora, reduzimos para 20 por 100 mil, um marco histórico”, afirmou Casagrande.
Paraná indica queda nos homicídios em 2024
O estado do Paraná ainda não consolidou os dados de dezembro de 2024. Com isso, a comparação considera os 11 primeiros meses do ano passado com o mesmo período imediatamente anterior. Em 2023, o estado registrou 1.922 homicídios dolosos, enquanto, até novembro de 2024, foram 1.620 casos.
Mesmo sem o total fechado, a tendência é de queda nos homicídios em 2024 em relação ao ano anterior. Segundo dados da Secretaria da Segurança Pública, a média mensal é de cerca de 150 mortes no estado paranaense. Mantido esse ritmo, o ano deve encerrar com aproximadamente 200 homicídios a menos que em 2023.
A Gazeta do Povo questionou a pasta da segurança sobre os dados de dezembro. A secretaria informou que os números ainda estão sendo compilados e serão divulgados "nas próximas semanas".
Minas Gerais é o único estado do Cosud onde homicídios aumentaram
O número de homicídios em Minas Gerais cresceu 4,6% em 2024 em relação ao ano anterior. O estado registrou 2.635 mortes violentas no ano passado, contra 2.517 em 2023, um aumento de 118 casos.
Em nota, a Secretaria da Justiça e Segurança Pública do estado afirmou que continua adotando estratégias integradas para conter a criminalidade. “As forças de segurança monitoram diariamente os índices criminais nos 853 municípios mineiros, buscando estratégias para minimizar ou reduzir o impacto da ação criminosa por meio de medidas preventivas, repressivas e ostensivas”, informou a pasta.
Fora do Cosud, Goiás reduz homicídios e tem aprovação popular na segurança
Em Goiás, os crimes violentos letais intencionais, incluindo homicídios dolosos, caíram 12% em 2024. O estado registrou 945 casos, contra 1.072 no ano anterior. A Secretaria da Segurança Pública destacou que em 92 dos 246 municípios goianos não houve nenhum homicídio ao longo do ano.
Os casos de estupro no estado diminuíram 6%, passando de 763 em 2023 para 716 em 2024. Os dados acompanham a percepção positiva da população sobre a segurança pública no estado. Segundo uma pesquisa do instituto Quaest, realizada em parceria com a Genial Investimentos e divulgada em dezembro de 2024, 71% dos goianos aprovam a gestão da área pelo governador Ronaldo Caiado (União).
- Metodologia da pesquisa: 1.100 entrevistados em Goiás entre 4 e 9 de dezembro de 2024. Nível de confiança: 95%. Margem de erro: 3 pontos percentuais.
Ex-secretário nacional da Segurança Pública analisa taxa de homicídios
O coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo e ex-secretário nacional da Segurança Pública José Vicente concorda que, em média, os estados do Cosud apresentaram bons resultados na redução de homicídios. “Os números são positivos, principalmente quando a queda ultrapassa 5% e se mantém progressiva ano a ano, como ocorre no Rio de Janeiro, Espírito Santo e Rio Grande do Sul”, avalia o especialista, em entrevista à Gazeta do Povo.
Para o coronel, a alta redução no estado gaúcho é uma consequência das enchentes enfrentadas no ano passado. "O Rio Grande do Sul teve queda de 17%, bastante significativa, mas isso deve ser um componente das enchentes que atingiram por dois meses o estado e isso tem resultado socioeconômico para a região", diz José Vicente.
O ex-secretário afirma que, apesar de a redução do estado catarinense ser inferior a 2%, é uma taxa relevante. "Santa Catarina apresentou uma queda de 1,8%; é praticamente estabilidade do ano anterior, mas como a taxa de homicídio no estado é baixa, é uma taxa relevante", analisa ele.
No caso do Espírito Santo - com redução de 12,8% - José Vicente observa o contexto: o estado historicamente esteve acima da média nacional de homicídios. “É importante observar o impacto dessa redução no contexto geral da segurança pública capixaba”, afirma.
Sobre o Rio de Janeiro, o ex-secretário destacou que a queda nos homicídios é significativa, apesar das restrições impostas pelo Supremo Tribunal Federal às operações policiais em favelas. “Isso mostra que, mesmo com as limitações impostas pelo STF, houve redução, o que é um aspecto importante a ser analisado”, observa. No entanto, ele ressalta que o estado enfrenta um contexto único, com centenas de territórios dominados por facções criminosas fortemente armadas, em sua maioria ligadas ao Comando Vermelho.
Sobre o estado paulista, a análise dele é crítica em relação à considerada postura mais rígida na PM. "São Paulo também teve queda, um pouco acima da estabilização, mas mostra que os dados de altíssima letalidade policial não foram capazes de uma redução tão significativa como se esperava".
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